“…derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão…” Joel 2:28
Nietzsche declarou: “DEUS está morto.” E Nietzsche tinha razão.
O problema é que a superficialidade de nossa prática e pensamento religioso nos faz reagir a afirmações como esta sem a devida reflexão. Antes de buscar entender o que Nietzsche quis dizer, fazemos de tudo para provar a verdade “absoluta” de que DEUS na verdade está vivo. Sermões, PowerPoints, e até filmes em que o Cristão vence o argumento final (“Deus Não Está Morto”) aparecem neste contexto. Todas estas ações reacionárias nos dão um senso de conforto, de paz. Se “Ele vive”, podemos seguir nossa rotina, podemos “crer no amanhã”.
Ateísmo, em tese, não deveria causar tanto rebuliço no meio Cristão. Somos escravos da mídia e dos formadores de opinião do nosso tempo (religiosos ou não). Nesta escravidão voluntária, seguimos às perspectivas que nos são apresentadas e deixamos o texto bíblico –e o envolvimento com o mesmo– de lado. Sacrificamos o texto no altar da opinião… de outros. Mas uma leitura atenta às Escrituras atesta, por exemplo, que os profetas desenvolviam o papel dos “ateístas” de suas respectivas gerações.
Quando se fala em ateísmo imediatamente pensamos que o DEUS das Escrituras está sendo abandonado, enquanto na realidade, ateísmo meramente significa a rejeição da existência de divindades. Assim, existem vários tipos de ateísmo que variam de acordo com as divindades que são rejeitadas. Os profetas do Antigo Testamento repetidamente apelavam para que Israel “rejeitasse” as divindades feitas por mãos humanas. Chamavam o povo à prática de um ateísmo radical. Isaías vocaliza bem a preocupação: “cobertos de vergonha serão os que confiam em ídolos esculpidos, que dizem às imagens de fundição: vós sois nossos deuses” (42:17); e Jeremias complementa: “suas imagens fundidas são falsas, e nelas não há fôlego” (10:14).
Nietzsche quando declarou a morte de DEUS não estava enganado. Vivendo os efeitos das transições filosóficas do século XVIII ele simplesmente observou o fato que a maioria hoje não entende: “DEUS está morto” não aponta para uma morte literal de um DEUS no céu ou algo do gênero, mas à morte da dependência humana em DEUS e na religião. Após DEUS e a Bíblia serem sistematicamente afastados do meio público durante a modernidade este foi e ainda é o resultado. Nas transações comerciais, na política, na rotina do dia a dia, DEUS e religião não servem mais para determinar significado, não são uma forma válida de interpretar o mundo e a experiência humana como um todo. Do evolucionismo científico até a democracia capitalista o mundo opera hoje no entendimento de que DEUS não existe, ou como se DEUS não existisse. E isto é um fato.
Assim, Nietzsche tinha razão! E tinha tanta razão que até mesmo cristãos hoje em dia encontraram na palavra “religião” um bode expiatório. Tudo que há de ruim numa religiosidade superficial é atribuído a esta palavra e enviado para o deserto da irrelevância. A dependência de DEUS existe até certo ponto, mas a religião morre uma morte lenta. Numa sociedade que sofre sob o jugo da tirania de governantes que vivem em mansões construídas no abuso do pobre, e religiosos que vivem uma religião isenta do DEUS da Palavra, um novo chamado a um ateísmo radical é necessário. Cristãos e não cristãos, políticos e anarquistas, todos nós corremos o risco de adorar diariamente no altar da divindade do eu, da ganância, do lucro, do poder, do sexo, do orgulho, dos deuses deste tempo. E por isso, não deveríamos rechaçar não o ateísmo, mas sim, nossos deuses. Nos últimos dias o Espírito será derramado sobre todos. Isso não significa apenas uma redobrada manifestação profética, mas o ressurgimento do espírito profético. Do Espírito que traz desconforto, que nos deixa perturbados, alérgicos aos ídolos dentro, fora, e ao redor de nós mesmos. A manifestação do espírito profético que ouve e proclama a Palavra de DEUS sempre é seguida da implementação de um ateísmo radical. Pois o verdadeiro “teísmo” é em parte “ateísta.”