“Tudo fez formoso em seu tempo; também pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir a obra que DEUS fez desde o princípio até ao fim […] e isto faz Deus para que haja temor diante dELE.
Eclesiastes 3:11, 14
Precisamos enfrentar a realidade, encarar o fato, assumir a culpa: nós domesticamos as Escrituras. Personagens despedaçados são feitos santos por nossa pregação, textos complicados são exilados de nossa atenção e verdades profundas são ignoradas não recebendo a devida consideração. Escrituras domesticadas criam crentes domesticados, politicamente corretos e passivos. Enquanto isto, submersos a dois palmos da superfície, as Escrituras carregam um conteúdo muitas vezes contra-cultural e, ao mesmo tempo, violentamente necessário no nível existencial.
Um exemplo:
Desde cedo é passada para todos nós a bela lição culturalmente aceitável de que se tentarmos suficientemente, se nos dedicarmos, se nos esforçarmos ao máximo de nossa capacidade, iremos traspassar qualquer barreira, ganhar qualquer corrida e superar qualquer problema. Filmes, músicas e livros pregam este “evangelho segundo a auto ajuda”. Se você se esforçar, irá conseguir. Ou como diria até mesmo Renato Russo: “quem acredita sempre alcança”, ou ainda no ditado popular: “sou brasileiro e não desisto nunca”. De maneira imperceptível, somos educados a rechaçar todo e qualquer conceito de limite. A própria idéia de aceitar nossas limitações é inconcebível e considerado uma fraqueza.
Mas se analisarmos friamente as experiências desta existência que nos foi dada, perceberemos quantas vezes tentamos, nos esforçamos, fizemos o nosso melhor… sem o resultado –ou a “vitória”– desejado! Pelo menos na minha experiência tem sido assim. Eu não traspassei, ganhei ou superei nenhuma das barreiras diante de mim por simplesmente acreditar e/ou me esforçar. É natural que, como conseqüência da experiência de tentar e não conseguir, a frustração tome conta.
Conversando com um amigo há algumas semanas sobre limites e o significado da “eternidade no coração” em Eclesiastes 3, fomos confrontados com a idéia promovida pelo texto. De acordo com Eclesiastes, os limites estabelecidos no mundo e na experiência humana são divinamente estabelecidos. Somente quando nos abrimos para este fato, quando abraçamos nossos limites, é que nos colocamos na posição de nos relacionar com aquELE que não tem limites! Somente quando abraçamos nossa finitude, estamos preparados a entender aquELE que é infinito.
Esta idéia, além de radical, é completamente contra-cultural! Abraçar nossas limitações?! Ele colocou a eternidade no coração do ser humano para que possamos ansiar por mais do que nossos olhos podem ver enquanto criaturas. Mas pelo fato de sermos criaturas e de não podermos “descobrir a obra que DEUS fez desde o princípio”, ao abraçar nossos limites, nos colocamos no nosso devido lugar. O nosso limite aponta para a possibilidade da existência daquELE que não tem limites. Nos ensina a temê-lO.