O capítulo 10 do evangelho de Marcos é curioso por muitos aspectos. Nele encontramos o relato do encontro de Jesus com a multidão, com os discípulos, com crianças, com o jovem rico, com Pedro, com os irmãos Tiago e João e, ao final, com um cego chamado Bartimeu. Deixando de lado a imensa riqueza trazida por estes diversos encontros, gostaria de me deter apenas aos poucos detalhes dos diálogos de Jesus com os filhos de Zebedeu e com o cego Bartimeu.
Logo após a resposta de Jesus a Pedro, os doze são chamados e recebem a notícia que ao chegarem em Jerusalém, o filho do homem seria escarnecido, açoitado, cuspido e morto (vs. 33 e 34). O que se sucede é a insensível fala dos irmãos Tiago e João: “Mestre, queremos que nos faça o que vamos te pedir” (v.35); “permite que, na tua glória, nos assentemos um à tua direita e outro à tua esquerda…” (v.37).
Em contraponto ao pedido absurdo, podemos observar uma irônica inversão a partir do encontro de Bartimeu com o Cristo. Enquanto no primeiro encontro os irmãos se antecipam, aqui, o cego se apresenta porque é chamado e antes mesmo que pudesse fazer seu pedido é pego de surpresa com a indagação: “o que queres que eu te faça?” (v.51). A resposta é simples: “que eu tenha vista” (v.51). Ora, é sabido que para a mentalidade do hebreu do primeiro século, ser curado, para além do benefício de viver sem a mazela, representava uma reconciliação com DEUS; por causa disso o insistente pedido por misericórdia.
Outro paralelo a ser observado é que extrapolando a “visão” da majestade de Cristo –pois ali estava aquele que o reconciliaria com DEUS– ao gritar por misericórdia, Bartimeu revela o quanto “enxerga” sua própria condição. Mesmo passando a maior parte de seu tempo com o Cristo e, assim como Bartimeu, reconhecendo que estavam diante do messias, Tiago e João foram incapazes de “se enxergar”, o que por outro lado tornava visível sua insensibilidade àquele que anunciara o fatídico fim.
Diante dos pedidos de livramento, em função das mais assustadoras circunstâncias da vida, ou da simples realização de caprichos imediatistas, resta uma pergunta: o que mais precisamos? Se faz urgente dar um salto de fé no breu de nossa condição, na direção daquEle que nos reconcilia com o Pai. Bartimeu percebe a cura porque também discerne que sua maior necessidade era de reconciliação. Por sabermos que em Cristo estamos todos reconciliados e, por causa disso, cobertos por uma misericórdia que dura para sempre, o que mais teríamos a coragem de pedir?
Senhor, que eu me enxergue.