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Dois líderes –um Faraó no Egito e um rei em Babel– passam pela mesma situação de sonharem e não entenderem o sonho. Curioso é que reproduzem a mesma construção linguística (que somente aparece em uma outra ocasião, a dizer a de Gideão e a vitória de seus 300 homens sobre os midianitas em Juizes 7): “um sonho sonhei” (חלום חלמתי – ḥalom ḥalamti), em Genesis 41:15 e Daniel 2:3. Tanto o Faraó quanto o rei de Babel, Nabucodonozor, receberam sonhos sobre situações que envolviam o futuro do reino e não conseguiam saber o que significavam. E ambos tinham, em suas respectivas cortes, jovens hebreus que tinham o dom de interpretar sonhos.

José e Daniel tornaram-se conhecidos nos lugares em que habitavam por saberem interpretar sonhos (Gn. 37:5-10; 40:5-23; Dn. 1:17; 2:19; entre outros). E nas oportunidades que tiveram, ao interpretar sonhos diante desses governantes, exaltaram o poder de DEUS e o Seu controle (Gn. 41:25; Dn. 2:27-28).

Dentre diversos personagens bíblicos com histórias fantásticas e com similaridades, José e Daniel possuem um algo mais. Foram profetas em terras estrangeiras. Foram sonhadores e intérpretes de sonhos. Tornaram-se grandes nas cortes em que trabalharam (Gn. 41:38-45; Dn. 2:48-49; 5:29 e 6:1-3). Receberam nomes em outras línguas (Gn. 41:45; Dn. 1:7) e se adaptaram ao modo de viver do lugar onde estavam (Gn. 41:42, 45, 50; Dn. 1:7, 20; 5:29). Ninguém era mais conhecedor da cultura babilônica e dos caldeus do que Daniel. José sequer foi reconhecido por seus irmãos por, como diz o texto, estar vestido como um líder egípcio e casado com uma filha de sacerdote de um deus egípcio.

Receberam de DEUS a missão de serem testemunhas não entre os seus, mas em outros contextos. Mantiveram-se fiéis. Como? Demonstrando em toda e qualquer situação que sua lealdade era ao Rei dos Reis… e que somente Ele era o responsável pelo dom que tinham. Testemunharam dEle em toda a chance que tiveram.

O processo de “desviar-se” da cultura vai além da simples prática de coisas. É maior do que evitar ver ou ouvir. Foca-se demais na prática do separar-se por coisas que deixamos de fazer, em detrimento a coisas que efetivamente fazemos. A mesma voz que diz “sai dela” (Apocalipse 18:4) é também a voz que diz “ide” (Matheus 28:19). Abraçar a tensão entre ambos é necessário.

José e Daniel seriam facilmente considerados “liberais” em nosso contexto. Mas mantiveram-se fiéis no que era o essencial: e o essencial era a missão que tinham recebido de Deus.